Será que estou ficando ranzinza ou sempre fui? Não sou idoso, mas talvez cansado como o nosso Capiau.
A nova moda entre parlamentares, tanto da base governista quanto da oposição, parece reforçar a superficialidade do debate político. Inspirados no icônico boné vermelho de Donald Trump, com o slogan “Make America Great Again”, alguns congressistas brasileiros resolveram transformar o acessório em instrumento de disputa ideológica.
No último sábado (01), durante a eleição das mesas diretoras da Câmara e do Senado, parlamentares da situação apareceram ostentando bonés com a frase “Brasil é dos brasileiros”. Em resposta, na sessão de abertura do ano legislativo, na segunda-feira (03), a oposição adotou seu próprio lema: “Comida barata novamente. Bolsonaro 2026”.
Sou do tempo em que usar boné em locais solenes, como igrejas ou sessões parlamentares, era visto como desrespeito. Pastores e padres, ao avistarem fiéis de boné dentro do templo, interrompiam o culto para repreendê-los. Política, ao menos na teoria, deveria carregar um grau semelhante de seriedade e sobriedade.
Claro, o uso do acessório não é casual. Símbolos, frases de efeito e bandeiras estilizadas são instrumentos de comunicação política. Eles servem para gerar impacto rápido, especialmente nas redes sociais, onde uma imagem bem-posicionada vale mais do que longos discursos. A situação usa o boné para reforçar uma suposta conexão com o povo. A oposição, por sua vez, adota a mesma estratégia para parecer alinhada às bases populares e insurgentes.
O uso do boné por Donald Trump em sua campanha foi legítimo, pois em campanhas eleitorais é necessário consolidar uma marca, criando um símbolo que represente suas propostas e conecte-se com o eleitorado.
Mas até que ponto essa encenação no Congresso Nacional é legítima? O que parece é que os bonés mascaram a desconexão da classe política com os problemas reais da população. Política se faz com projetos concretos e compromissos efetivos, não com adereços de marketing eleitoral.
O governo tenta mudar o foco de um dos grandes problemas atuais – a disparada dos preços dos alimentos – e criar um antagonismo simbólico com Trump. Afinal, Lula (PT) foi eleito sob a promessa da “picanha e cerveja acessíveis”. Já o boné da oposição reforça uma narrativa questionável: de que os alimentos eram mais baratos no governo Bolsonaro (PL). A realidade, no entanto, é diferente. Durante sua gestão, o preço da cesta básica disparou, atingindo recordes históricos. Em 2022, ela chegou a consumir mais da metade do salário mínimo em diversas capitais.
O que vemos é um marketing político que transforma o Parlamento em palco, onde a imagem vale mais do que o conteúdo. Falta debate honesto e comprometido, que ultrapasse o simbolismo vazio dos bonés.
Vivemos uma era em que políticos se elegem e se mantêm no poder por meio de lacrações e caça a “likes”, em discussões ideológicas rasas que pouco fazem para melhorar a vida da população. No fim das contas, essa teatralidade custa caro – e quem paga a conta somos nós, cidadãos comuns.
Se o boné virou símbolo de resistência ou adesão, cabe ao eleitor interpretar. Mas, acima de tudo, cobrar coerência entre o que está na cabeça dos parlamentares e o que deveria estar no coração das políticas públicas.
Max Pavanello
Advogado, Conselheiro Estadual da OABSP, presidente do PDT de Piracicaba
Texto publicado em A Tribuna Piracicabana, edição 13565, de 07/02/2025.